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Connect Four: Entrevista para Clash Magazine

“Essa é a nossa razão de viver. Nossa missão de vida. Esse é nosso show.”

Coagido pela força imponente da lei cósmica para compartilhar o amor por toda parte, a grande jornada generosa dos Red Hot Chili Peppers tem sido uma aventura longa e memorável. E o último ato do grupo – entregar o melhor álbum dos últimos 20 anos – acontece no momento em que as estrelas se realinham para guiá-los. Só não chame isso de retorno.

Por: Simon Harper / Tradução: Amanda Colombo

“Nós nunca partimos”, começa Flea. “Somos apenas uma banda; continuamos sendo uma banda, continuamos trabalhando, criando.” O lendário baixista dos Chili Peppers está largado em uma poltrona almofadada na primeira fileira do seu cinema em casa, um refúgio escuro em seu oasis ensolarado, Malibu. É pouco depois das 9h da manhã, mas ele está de pé há horas, correndo com os cachorros nas trilhas das montanhas que rodeiam seu paraíso tropical. O nível de energia está alto e ele está disposto a explicar as situações que sua banda enfrentou e que levaram ao lançamento do incrível ‘Unlimited Love’, o primeiro álbum nessa nova década imprevisível.

No início do verão de 2016, a Clash teve uma reunião com Anthony Kiedis, o imporvável vocalista jovial dos Chili Peppers, no período de lançamento do 11º álbum, ‘The Getaway’. Uma aventura gentil e minuciosa, encorajada pelos métodos de produção efetivos do Danger Mouse. Esse foi o segundo álbum com o guitarista recém chegado Josh Klinghoffer, o qual se adaptou bem ao seu papel e difiniu seu lugar no legado musical dos Chili Peppers. “Nós éramos um”, disse Kiedis durante a criação do álbum. “Antes estávamos tentando encontrar o lugar do Josh, e agora não há mais diferença entre eu, ele ou o Flea; nós éramos uma coisa só.”

Em dezembro de 2019 o grupo fez uma declaração repentina anunciando a saída de Klinghoffer e o retorno do antecessor, John Frusciante. Os fãs foram pegos de surpresa; o choque de perder Josh de repente bateu de frente com a emoção de receber de volta o John, cujo qual a música impecável pode ser ouvida nos mais famosos e célebres álbuns dos Peppers.

Não é preciso dizer que esse foi um desfecho inesperado na saga dos dramas pessoais e complicados do grupo, os quais lamentavelmente começaram nos primeiros anos. O gênesis do Red Hot Chili Peppers começou quando Kiedis e Flea se juntaram com o guitarrista Hillel Slovak e o baterista Jack Irons na época da escola durante o fim dos anos 70. Em 1983, o grupo anarquista era a animação dos clubes de Los Angeles e foram prontamente adquiridos pela EMI. Porém, antes de começar a trabalhar em seu primero álbum, Slovak e Irons saíram e escolheram focar em outros projetos, sendo substituidos por Jack Sherman (falecido em Agosto de 2020) e Cliff Martinez, respectivamente, o qual tocou no vigoroso álbum auto entitulado em 1984. Para o álbum de 1985 porduzido por George Clinton, o funky ‘Freaky Styley’, Sherman estava fora e Slovak retornou. Irons dispensou Martinez para ‘The Uplift Mofo Party Plan’ em 1987, reunindo assim os quatro fundadores até a trágica morte de Slovak em 1988. John Frusciante, um grande fã de 18 anos, foi convocado para a guitarra ao mesmo tempo em que Chad Smith sucedeu Irons, o qual saiu em razão da perda de seu amigo.

Após os primeiros passos juntos no álbum ‘Mother’s Milk’ de 1989, os quatro lançaram a obra de arte do grupo, ‘Blood Sugar Sex Magik’ em 1991, entrando no mainstream com o hino de isolamento ‘Under The Bridge’. Sobrecarregado com o sucesso do álbum, Frusciante deixou a banda em 1992. Enquanto o guitarrista do Jane’s Addiction, Dave Navarro, se juntou para gravar o álbum ‘One Hot Minute’ em 1995, Frusciante estava sofrendo com o vício em heroína e depressão severa. Logo após a saída de Navarro, Frusciante já reabilitado aceitou a proposta de retornar e se fez presente durante a brilhante série de álbuns clássicos – ‘Californication’ em 1999, ‘By The Way’ em 2002, e ‘Stadium Arcadium’ em 2006 – até decidir deixar a banda novamente em 2009. Josh Klinghoffer, que havia tocado com Frusciante em seu projeto paralelo, Ataxia, e com os Chili Peppers em sua última turnê, foi o mais provável candidato para o posto, o qual ele assumiu até um dia fatídico de 2019, quando ele chegou para uma reunião com a banda na casa de Flea apenas para ser informado de que seus serviços não eram mais requisitados.

“Ele não fez nada para merecer ser demitido”, diz Kiedis sobre Josh quando a Clash o ligou a caminho dos ensaios. “Ele era ótimo, um ser humano maravilhoso de se conviver e nós não estaríamos aqui hoje se não fosse pelo Josh.”

Kidies atribui a necessidade de mudança a uma “espécie de presença psíquica no ar”, onde a ideia da volta de Frusciante ocorreu simultaneamente entre ele, Flea e surpreendemente, John. Sementes foram plantadas quando Flea começou a passar mais tempo com seu velho amigo e conversaram sobre a mágica indescritível que eles fazem juntos.

“Nós dois sentimos um desejo poderoso de tocar juntos e tivemos uma conexão emocional certo dia que foi linda, um ano antes dele voltar, e pareceu ser uma ótima oportunidade” diz Flea, sugerindo que perder Josh e seguir com John foi “a coisa certa a se fazer” baseada em instinto. “A energia do universo está sempre se movendo e eu sempre senti como se estivesse vivendo a vida tentando ser uma pessoa presente e consciente o suficiente para seguir seu coração e a luz que te guiam pela vida, ao invés de ter uma ideia preconceituosa ou algo assim.”

O processo de incorporar Frusciante de volta ao grupo, diz Kiedis, foi “gradual”, e começou com conversas abertas sobre qualquer medo entre o grupo. “Quando nos reunimos conversamos sobre como nos sentíamos”, continua ele, “pareceu que toda preocupação e danos encontraram um jeito de se resolverem e se curarem sozinhos de certa forma que, no fim, o valor da criatividade e fazer música juntos como uma família superou qualquer diferença que nós podemos ter em questão de personalidade. Porque, no fim das contas, às vezes essas particularidades entre irmãos são o que realmente os tornam criativos, especiais e interessantes, e por mais ferrado que eu ou qualquer outro da banda possa ser, é isso o que os torna especiais e fazem deles o que são.”

O grupo já havia começado a tocar e compor junto quando a pandemia do COVID-19 atingiu a California e o estado emitiu a ordem de isolamento, inmpedindo o progresso deles até o momento. Mas dessa vez “não perdemos o foco”, insiste Kiedis, e se provou um período construtivo para o crescimento pessoal e criativo. Para Kiedis, ele permitiu a oportunidade de focar em compor letras para as jams instrumentais que haviam feito até então, “porque é bem difícil acompanhar a velocidade de produtividade da minha banda como compositor de letra” diz ele. Esse trabalho começou em sua casa em L.A., e então moveu para o Hawaii, quando Kiedis e Rick Rubin – produtor de todos os álbuns dos Chili Peppers, exceto ‘The Getaway’, desde 1991 – chegaram um dia antes do isolomento do estado. “Ele e eu tivemos seis meses para acordar, compor e cantar por algumas horas, e tínhamos essa mentalidade relaxada de não prestar atenção em nada a não ser na música a nossa frente”, explica Kiedis. “Eu provavelmente nunca teria conseguido terminar meu trabalho sem ter aquele tempo e lugar.”

Enquanto isso, de volta em L.A, a condição daqueles que sofriam financeiramente durante a crise de saúde levou Flea a gerenciar um food truck, trabalhando com projetos beneficentes para alimentar comunidades carentes da cidade. Em casa, o descanso permitia a Flea a mentalidade para criar ainda mais músicas, o que, no fim das contas, era com o que Frusciante também estava se ocupando.

Porém, quando os Chili Peppers finalmente se reuniram, eles tinham muito mais músicas do que era preciso para um álbum. Sua produção abundante foi produto da energia que eles colocaram desde a volta, onde os covers favoritos e as primeiras músicas dos Peppers foram tocadas com entusiasmo para conectar o espírito que os incitou na juventude. Também permitiu a Frusciante, quem mal tocou na guitarra nos últimos anos enquanto focava em sua aposta na música eletrônica, se reconectar com seu instrumento.

No fim, após muita conversa, persuasão e comprometimento, uma lista final de 17 músicas foram escolhidas para se tornarem ‘Unlimited Love’ (o resto, promete Kiedis, irá ser lançado “quando for a hora certa”). O que impressiona nesse método é que essas boas escolhas de música, quando ouvidas de uma vez no contexto de um vinil, soam tão conectadas; há uma coerência com o panorama sonoro do álbum, em termos de influências, intensidade, formato e texturas meticulosas, que é quase impossível acreditar que essas 17 músicas nunca foram designadas especificamente para co-existirem.

Quando a Clash contou a Kiedis que detectamos uma vibe predominante dos anos 70 no álbum – evidente nos grooves funky de ‘Aquatic Mouth Dance’, a vibe disco de ‘She’s a Lover’, os riffs ousados do Sabbath em ‘These Are The Ways’, o jazz cósmico no solo de baixo em ‘One Way Traffic’ – ele rapidamente nega que esses padrões repetitivos foram intencionais, são mais uma mera consequência da vasta inspiração do grupo. “Eu acho que nunca tivemos uma conversa sobre como queremos que nossas músicas ou álbuns soem”, afirma ele. “Vem de vários lugares diferentes e nada disso é fruto de uma discussão… Nós ouvimos tudo. Nunca tivemos um limite ou requisito para o que pode ou não ser uma música do Red Hot Chili Peppers; nós consideramos tudo.”

“Isso é algo que eu sempre amei e me inspirei na banda”, diz Flea, aproveitando o assunto para o significado do nome do álbum, “É sobre não deixar o gênero ou estilo interferir na sua forma de expressão. Nós podemos ir onde quisermos. É ilimitado, é amor, é música, é beleza. Tudo é válido, tudo é bom. Sabe, nunca se prenda a uma fórmula, nunca tente fazer algo em que você pensa ‘Ah, isso é o que nós somos, o que fazemos.’ Não, nós fazemos tudo.”

E realmente, a coerência do álbum é um reflexo da relação entre esses quatro músicos nesse ponto preciso da vida deles. Seus objetivos individuais – desde a excursão de Frusciante com a música eletrônica até Chad Smith criando beats para Dua Lipa – os levaram a um lugar que foi bem explorado no ambiente de processo criativo do grupo, o que Flea afirma ser “melhor do que nunca”.

“O álbum é uma cápsula do tempo de nós juntos agora”, acrescenta ele, “amando música, tendo fé um no outro e tentando fazer a melhor coisa que podemos.”


Como eles irão lidar com isso quando for a hora de levar o show para a estrada é um outro assunto, conforme a pressão e monotonia da turnê pode ameaçar estremecer o foco do grupo. Embarcando em sua primeira tour exclusivamente para estádios, a esperança é de que, não apenas a novidade mantenha a experiência fresca, mas que também tocar para tantas pessoas ao mesmo tempo fará com que a banda crie imensas quantidades de amor recíproco. “Eu espero que toque os corações”, declara Flea.


O Chili Peppers retornam para essas margens pela primeira vez em quase cinco anos nesse verão, as datas de Londres coincidindo com Glastonbury (“Eu não acredito que nunca fizemos isso”, diz Flea entusiasmado. “Eu queria que fizemos”) e todos os sinais apontam para as expectativas de Flea se realizando. Performances recentes em L.A, Nova Orleans e Las Vegas corroboram sua insistência de que a banda está “a todo vapor”, documentando o melhor de si em ‘Unlimited Love’, portanto os níveis de empolgação estão altos.
Porém, conforme Flea reafirma, esse momento é simplesmente uma continuação do poder potente que quarteto sempre teve.
“Eu não vejo como uma reencarnação, renascimento, nem nada disso”, diz ele, voltando ao assunto. “Eu apenas vejo que nós ainda estamos fazendo isso para valer, cara, entende? É o que fazemos. É nossa razão de viver. Essa é nossa missão. Esse é nosso show.”


Por: Simon Harper
Fotografia: Clara BalzaryMini Title e Gus Van Sant
Tradução: Amanda Colombo

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