Entrevista dos Chili Peppers para a revista Q Magazine
E as entrevistas não param de surgir. Dessa vez foi a Q Magazine, uma revista do Reino Unido.
Na matéria eles falam sobre o ex-guitarrista John Frusciante e de sua saída da banda e como foi trabalhar com o também ex-guitarrista, Dave Navarro. O quanto foi diferente o trabalho com Josh Klinghoffer. Sobre o seu polêmico livro, Scar Tissue, Anthony Kiedis diz: “Poderia ter revelado muito mais”. Chad Smith brinca sobre a sua semelhança com Will Ferrell.
Flea se emociona enquanto conta sobre um menino que ele ajuda em seu Silverlake Conservatory.
Falam sobre drogas e Flea diz: “Eu ainda fumo maconha de vez em quando”.
É uma excelente entrevista. Uma das melhores já concedidas pela banda.
Confira a tradução da máteria abaixo:
“Morrer nunca pareceu uma boa idéia…” Red Hot Chili Peppers não serão mortos.
“Tenho certeza que vou ter que urinar antes de terminar”, diz o baixista Flea à “Q” na entrevista (e 36 minutos depois, ele foi ao banheiro).
Como o esperado de alguém que passou horas com seu terapeuta, ele enfrenta a tensão na sala.
“Tem uma coisa que eu queria dizer”, ele diz, com cada palavra saindo como se fosse uma metralhadora. “Sou muito grato ao John Frusciante. Ele fez muita coisa pela nossa banda. Como um amigo, como um companheiro de banda, ele é insubstituível”.
Q Magazine: Por que ele saiu de novo?
Flea: Você tem que perguntar à ele, provavelmente um bilhão de diferentes motivos. John é um homem muito inteligente e está fazendo o que ele quer. O que mais você pode querer de alguém?
Q: Você imaginou que isso aconteceria?
Flea: Estou aberto a qualquer coisa que aconteça a qualquer momento.
Anthony: Isso não me surpreendeu em absoluto. Quando a turnê acabou, eu sabia que uma mudança estava por vir – e com o passar dos meses e coisas que ouvia do John, eu já sabia que era questão de tempo. Mas nunca senti que havia acabado para a banda, só que John estava se “aposentando” graciosamente, o que realmente aconteceu. Foi para o bem de todos e uma benção.
Q: Então você nunca considerou acabar com o Red Hot Chili Peppers – sendo que a banda já teve 7 guitarristas?
Anthony: Nossa. Sabe, eu nunca contei guitarristas. Mas não, falando por mim mesmo, nunca pensei. Acho que fazer isso seria desistir, porque eu sempre acho que o melhor está por vir.
Flea: Eu achei que se o John saísse, eu definitivamente não queria continuar a banda sem ele. Mas depois que ele saiu, algo mudou em mim e encontrei um amor muito profundo pelo Chili Peppers e particularmente pelo Anthony. Nós somos amigos desde que tínhamos 15 anos. Éramos inseparáveis. E embora nosso relacionamento tenha sido bem hostil…Nós somos tipos de pessoas diferentes. Nós nos ofendemos e podemos ser um casal de moralistas com cara de buc*e*a! Mas eu realmente amo ele, ele é meu irmão.
Q: Tinha um precedente do One Hot Minute a se considerar. Não foi bom, foi isso?
Flea: Pode ter havido um pouco de medo por um tempo. Mas o lance é o seguinte, Josh colocou seu coração nesse novo álbum e eu sabia que se ele tivesse feito aquilo, aí poderíamos ter feito errado. Deus abençoe Dave Navarro, ele é ótimo, mas seu coração não estava conosco. O processo inteiro em fazer aquele álbum, foi como arrancar os dentes em todos os sentidos.
Anthony: Com certeza foi um período estranho. Musicalmente foi estranho, porque pessoalmente foi estranho. Eu estava saindo de um período obscuro e Flea estava tendo suas próprias lutas pessoais. Deus sabe o que Chad estava fazendo, mas provavelmente estava em um armário escuro em algum lugar. E aí, Dave Navarro é um personagem um tanto incomum e colorido. Considerando tudo, o fato de termos escrito músicas e gravado um álbum, foi uma realização.
Q: Josh parece irritantemente jovem…
Flea: Oh, ele vai conseguir todas as buce*as.
Q: Falando sobre as primeiras impressões do álbum, parece que ele trouxe algo ótimo para a banda…
Anthony: É como começar de novo sem ter que fazer 25 anos de trabalho.
Flea: A parte mais complicada de tocar com Josh, pra mim também foi a melhor, que é o fato de ele ser completamente diferente do John. Tinha coisas que eu esperava que John fizesse: ele é um músico fenomenal, que eu estava acostumado a tocar algo e -bam!, John iria acompanhar. Ele, Chad e eu fechávamos, e era indiscutivelmente bom. Josh é bem diferente. Ele ficava flutuando, viajando com essa textura etérea, e eu pensava: “Whoa! Quando ele vai fazer aquilo que sabemos? E ele não fazia. Eu tinha que dizer pra mim mesmo: ‘cara, relaxe’.
Q: Como foi isso pra você, Josh? Se juntar à uma banda com uma história tão grande e ter que preencher os sapatos (lugar) de uma pessoa tão imponente?
Josh: Eu não poderia começar a achar que substituiria Frusciante. Então só poderia resolver e fazer algo novo com esses caras.
Anthony: Os sapatos de John foram tão bonitos, não poderíamos esperar que Josh fosse como ele. Apenas trazer sapatos novos. Josh tem sapatos incríveis.
Q: O twitter não existia na última vez que vocês fizeram um álbum. Flea, você twittou o nome do novo álbum 3 vezes em poucos minutos na noite passada.
Flea: Twittar me faz querer chupar meu próprio pênis. Se você for beber um monte de café, ou você borra suas calças ou começa a twittar. O Chad conhece esse cara…
Chad: Oh não, não, não!.
Flea: O quê? Bem eu conheço um cara…(olhando para o Chad). Assim está melhor? Esse cara tomou muito café. Ele agachou pelado numa mesa de vidro, daquelas que caras pervertidos deitam. E aí ele fez esse grotesco e psicodélico líquido marrom na mesa e os caras iriam deitar nisso e bater seus pênis.
Chad: Era chamado de O Barco com fundo de vidro.
Flea: Uma parte tangencial da cultura humana que eu acho que recebe pouca atenção. A humanidade é cheia de grandes coisas, como Bach, Charlie Parker, Da Vinci e O Barco do fundo de vidro.
Q: Havia evidentemente um grau de atrito dentro da banda depois que Scar Tissue saiu… (o livro)
Anthony: Choque, horror.
Q: Você revelou muito?
Anthony: Poderia ter revelado muito mais, realmente poderia. Foi minha primeira tentativa em tentar contar a verdade sobre mim mesmo… e você tem que ter a consciência de não contar as histórias dos outros de um jeito que eles fiquem inconfortáveis com isso. Em retrospecto, eu cometi erros ao longo do caminho e pedi desculpas por eles. Causou um pouco de conflito, mas acho que fui perdoado. Pela maioria.
Q: Você já terminou de ler o livro do Anthony, Flea?
Flea: Eu nunca terminei, não. Vai chegar um momento em que vou querer, mas isso meio que me assusta. Obviamente, é a perspectiva do Anthony sobre o que aconteceu…
Q: Se a história dos Chili Peppers virasse um filme, qual seria o ponto dramático?
Anthony: Ohh Deus, qual é! Tanto drama. Mas obviamente a morte do Hillel, a maior perda e momento marcante de nossas jovens vidas naquela época. Ter 26 anos e perder o ventrículo esquerdo do coração foi provavelmente a coisa mais dramática que já aconteceu na minha vida. Mas amo nossa história, por melhor ou pior que fosse, pela dor, pelos ganhos. Todos fomos putos de vez em quando, e todos cresceram durante esse tempo também.
Flea: Todas as coisas que deram errado, foram dificieis. Mas por causa dessa dificuldade, foi uma grande oportunidade para o renascimento, todas as vezes. Eu aprendi a ser grato pelos desafios, porque eu sei que não importa o quão difícil seja, algo bom sempre vem depois. Essas duas coisas não podem existir uma sem a outra.
Chad: O que eu sei, é que não quero que o Will Ferrell me interprete nesse filme.
Q: Algum arrependimento?
Anthony: Não enquanto estou sentado aqui.
Flea: Mudar todas as merdas que fiz? Não. Você chega nesse mundo e tem que cometer erros para crescer. Eu já fiz tantas coisas. Eu fui um rude, desagradável, egoísta, moralista e idiota muitas vezes. E sou grato por isso.
Q: Anthony, você escreveu em Scar Tissue sobre estar fora dos trilhos durante a turnê do Californication, em ficar enfurnado num hotel de L.A. com sua namorada, fumando crack e heroína durante 24hrs por dia. O quanto de culpa, ao longo dos anos, você atribui à sua educação não convencional?
Anthony: Humm, isso era uma pequena bomba de tempo dentro de mim que sempre ficou esperando para explodir. O ambiente tem uma influência, mas eu acho que teria acontecido independentemente da minha educação. Tinha algum demônio lá, esperando pela sua hora.
Q: Você se pergunta como que ainda está aqui?
Anthony: Nunca achei que morrer fosse uma boa idéia. Acabei de ter um filho, então estou procurando um longo percurso no momento.
Q: Como foi na universidade, Flea?
Flea: Eu amei, e honestamente, adoraria voltar. Eu mal passei pelo ensino médio. Eu nunca fui uma pessoa educada fora do meu próprio processo de crescimento. A principal coisa que fiz, foi analisar Bach. O que ele fez foi o auge da realização humana. Tendo, 5 diferentes e complexas melodias ao mesmo tempo, cada uma sendo a coisa mais maravilhosa que você ouviu, e todas trabalhando juntas. A geniosidade confunde a mente. Eu gostava de estar em um lugar onde eu não tinha que me sentir culpado por escolher o cérebro de alguém.
Q: O Silverlake Conservatory já tem 10 anos…
Flea: É uma grande parte da minha vida. É difícil manter financeiramente, mas é uma coisa maravilhosa. Eu fui uma criança difícil. Eu ficava na rua, invadia as casas das pessoas, usava drogas – todas essas coisas. Mas a única coisa que me mantia intacto, era ir na escola e tocar na banda de jazz, na banda marcial. A música me deu senso de disciplina. Senão, quem sabe o que teria acontecido comigo.
Q: Você leciona no Conservatório também. Qual o segredo da boa aprendizagem?
Flea: Para responder essa pergunta, eu quero contar uma rápida história. Tinha uma criança que eu dava aula, ele tinha uns 10 anos. Foi durante o período que o Chili Peppers ficou 6 meses parado, e eu estava lá o tempo todo. Eu estava ensinando trompete pra ele. Era um menino que estava sendo jogado de casa em casa de adoção, e ele tinha dificuldade em prestar atenção. Eu criei amizade com ele, então ia buscá-lo todas as manhãs – ele estava morando num orfanato horrível. Ele gostava de música, mas não sabia quase nada a respeito. Mas ele pegava seu trompete e se dedicava. Eu via seu rostinho, absolutamente determinado a tirar um som daquela coisa. Esse garoto, na última vez que falei com ele há alguns meses, ele havia entrado na USC. (Flea olha pra cima e começa a chorar). É tão lindo. Significa muito para mim. Fico emocionado com isso (Flea se recupera).
Q: Vocês estão perto dos 50 anos já..
Flea: Estou, mas também mais consciente do que nunca sobre cada momento que passa. Eu realmente sinto alegria e uma profunda satisfação em estar no momento.
Anthony: Eu gosto da idéia de desafiar a norma de como é estar nos seus 40, 50, ou 60. Descobrir o surfe nessa etapa da minha vida, definitivamente vai me manter ativo até o dia que eu morrer. Então, sim…eu aceito o desafio. Do mesmo jeito que (o guru nutricional americano, o The Godfather of Fitness) Jack LaLanne fez, fazendo coisas aos 70 anos que nenhum homem na Terra faz: puxar rebocadores no San Francisco Bay com os dentes.
Q: Como que o seu regime diário agora, difere de 15..20 anos atrás?
Anthony: 100%
Q: Significa o que, precisamente?
Anthony: Significa 100%
Flea: Acho que estou mais feliz agora, do que em toda minha vida. Acho que nunca amei completamente quem eu era antes, e isso sempre me incomodou. Meus relacionamentos com as pessoas em geral são muito melhores. Mas minha rotina é praticamente a mesma. Eu acordo e faço algum exercício físico. Vou surfar, participei da maratona de L.A. esse ano. E depois, é um dia de músicas e entes queridos.
Chad: O meu é muito diferente. Há 20 anos atrás, eu queria escapar de mim mesmo. Eu fazia qualquer coisa pra isso – andar de moto, ficar chapado, mulheres, drogas…Eu não sou assim hoje. Eu sou um pai, um marido. Não sou perfeito, mas vejo progressos.
Q: Como é fazer parte do Chickenfoot?
Chad: Fico ouvindo histórias sobre Eddie Van Halen do Sam e o Michael.
Anthony: Acho que nunca ouvi Chickenfoot. (para Josh) Vocês já? (para Q)
Q: Não.
Anthony: Aí está: Três homens em uma sala que não escutaram Chickenfoot.
Q: Qual é o final da linha?
Flea: Eu sempre achei que esmagar uma grama de cocaína iria estourar a po**a dos seus olhos…
Chad: Tem essa nova droga que supostamente é mais tóxica que o crack.
Flea: Nós crescemos em uma cultura de drogas, e quando era mais novo, eu usei muito. Quando parei, no começo fiquei entediado. Tipo: ‘Deus, isso é chato.’ Aí comecei através de outros meios, a ter experiências alucinógenas – como meditações e coisas espirituais. Todas essas coisas (por meio do qual), eu definitivamente entro num estado alterado de consciência. Tem várias maneiras de ficar chapado, com as drogas você só fica mais rápido. Eu ainda fumo maconha de vez em quando, mas estou praticamente sóbrio.
Chad: Já fiquei tão louco a ponto de ter uma experiência de quase morte quando bati minha moto. Tem um lugar no Sunset Boulevard chamado Dead Man´s Curve. Tomei muito ‘Island Iced Teas’ e fui virar a esquina com minha moto. Estava no trânsito e naquele momento, eu sabia que não iria conseguir voltar. O mundo ficou parado completamente. Tudo estava super brilhante. Eu podia ouvir os pássaros piando. Foi uma experiência incrível.
Flea: De todas as descrições que você ouve de pessoas esclarecidas, é assim que é o tempo todo.
Chad: Nada vence isso. Se você pudesse viver sua vida assim, sem o perigo iminente do carro, seria a coisa mais foda. Mas só durou uns 3 segundos, e depois: ‘bam! argggghhh!
Anthony: Acho que morrer é o fim da linha. Eu gosto de como o Chris Rock (comediante) quer morrer: dirigindo a 150 enquanto uma Kardashian* te chupa, e ouvindo o primeiro álbum do NWA no último volume.
Q: Como você quer morrer?
Anthony: No banco de trás com a outra irmã Kardashian, é claro.
Q: Quando você chegou ao fundo do poço?
Flea: Estive muito mal no passado onde em alguns momentos eu questionava o valor da minha existência. Foi o fundo do poço pra mim. Mas agora estou por cima.
Q: Quando foi a última vez que chorou?
Josh: Dois anos atrás. Meus tubos de lágrimas nunca funcionaram direito.
Anthony: Eu sou um chorão, me avisa se você precisar de algumas dicas. Eu poderia chorar todos os dias, de um bom jeito. Se eu apenas sentar e pensar no meu filho. Sentei no avião recentemente, indo do Hawaí para Los Angeles, com Rick Rubin e assistimos o filme do Justin Bieber, Never Say Never. Chorei umas 2 vezes durante esse filme e quero que o mundo saiba disso! Eles estavam sorteando ingressos de show para garotas de 16 anos. O sorteio não importava, mas sim a reação daquelas crianças. Quando vi aquelas garotas chorando loucamente, eu perdi a cabeça. Decidi contar ao Rick e ele disse: ‘Eu também estava soluçando durante aquela cena’. Aí está.
Q: Tem algo a mais para declarar?
Flea: Está tudo bem, cara.
[A entrevista também falou sobre a história da banda, mas isso não é nenhuma novidade]
…
Transcrição da revista: Helen Henderson.
Tradução: Amanda Olivieri.
Agradecimentos: Ana Paula Mancini.
*Obs: “Kardashian” é Kim Kardashian. Modelo, socialite e atriz que teve divulgada uma gravação de imagens em relações sexuais dela e o cantor Ray J vazada.
Imagens da Revista aqui.