Entrevistamos o Scott Holthaus, o cara das luzes dos shows do RHCP
Scott Holthaus é o responsável pelas luzes durante os shows do Red Hot Chili Peppers desde 1999. Em uma colaboração entre o RHCP Brasil e o 5 Notas, ele recebeu o Wendell Correia para um bate papo sobre a turnê da América Latina em 2023 no dia anterior da apresentação da banda em São Paulo no Estádio do Morumbi. Falou como é feito seu trabalho, os perrengues e grandes momentos durante os shows, como é trabalhar com os Chili Peppers e as experiências que teve com outras bandas, como Jane’s Addiction, Offspring, Bryan Adams e Sepultura.
Confira a entrevista com o Scott Holthaus:
WENDELL CORREIA: Como você está, Scott? Obrigado por me receber.
SCOTT HOLTHAUS: Demais! Estou feliz de estar aqui. Eu amo o Brasil.
W: Como é esse dia anterior do show?
S: Além do palco não estar pronto? (risos). Está tudo certo! Estamos numa sequência boa agora, acho que as pessoas já conseguem até preparar de olhos fechados. Estamos empolgados, esse será um show realmente grande. Serão muitas pessoas mesmo e o público brasileiro é sensacional! Então será divertido.
W: Nós, brasileiros, realmente somos diferentes comparados aos públicos de outros países?
S: Meu Deus! Tem o Brasil, Espanha, Itália e então vem os outros países do mundo, sabe? As pessoas ficam assistindo com braços cruzados olhando para os celulares.
W: E desde quando você é o responsável pelas luzes do palco do Red Hot Chili Peppers?
S: Desde 1999. São 24 anos, cara. Eu trabalhei com o Flea no Jane’s Addiction antes disso e o empresário da turnê do Jane’s Addiction também era o empresário do RHCP. Na verdade, o técnico de baixo do Jane’s Addiction era o empresário da turnê do RHCP. E depois dessa turnê, ele me perguntou: “Quer fazer isso com RHCP também?”. E eu respondi: “O que? É claro!”. E faz todo esse tempo.
W: De onde você é?
S: No momento estou morando na Ilha Kauai no Havaí. Tenho uma fazenda lá. Eu surfo, ando a cavalo e me divirto.
W: O que fez você querer trabalhar profissionalmente com as luzes de um show?
S: Eu meio que fui parar nisso. Um amigo me pediu para substituí-lo em um bar nos Estados Unidos em 1982. Eu achei isso divertido, além de me divertir com meus amigos, viajarmos juntos, como se fosse um circo. E achei algo fácil de fazer, uma forma fácil de ganhar dinheiro e conseguir viver disso. Além de gostar de viajar. E nunca tive outro trabalho até hoje.
W: Falando sobre o processo de criar essas luzes durante os shows: cada música tem uma sequência de luz específica? Como você trabalha isso? Trabalha junto com a banda ou são só suas ideias? Como funciona?
S: Com certeza é uma colaboração entre várias pessoas. Tem sequências programadas com a ajuda da esposa do John Frusciante, que fez a criação de conteúdo. E nós juntamos tudo isso e acho que muitos designers começam com o vídeo. Então com esse conteúdo, vem as camadas de luzes junto. Muitas das luzes são mapeáveis, então muita coisa é “trapaça”. Muitas coisas são vídeos sendo formados com as variedades de luzes. E como a banda não gosta de fumaça, muitas coisas têm que ser miradas diretamente no rosto, sabe? É o que temos. E esse mapeamento com certeza ajuda, pois faz uma sequência orgânica do vídeo para as luzes, então fica sendo uma coisa só. E é fácil de programar.
W: Quantas músicas os Chili Peppers têm ensaiadas para a turnê? E o que você faz quando eles querem tocar algo muito diferente, como “Sikamikanico”?
S: Todas as noites, o Anthony Kiedis escreve o setlist cerca de uma hora antes do show. E, como você sabe, vão ter entre oito ou dez músicas que são hits muito conhecidos. E eles gostam de manter o set renovado. Eles tocam mais músicas novas do que qualquer outra banda para qual já trabalhei. Eles gostam de tocar músicas novas mesmo sabendo que a galera quer ouvir “Under The Bridge”, esses sucessos. Tem muitas músicas novas. Meu time tem cerca de 55 a 60 músicas prontas porque eles sempre vão tocar uma ou outra dos anos 80 para dar uma renovada no setlist. E isso é legal para nós. Quando eles tocam “Skinny Sweaty Man”, fico muito feliz.
W: Eles já tocaram “Skinny Sweaty Man” com você?
S: Sim! Isso aconteceu há cerca de um mês. Músicas antigas como essa, que são dos anos 80 e 90 que são bem legais, agitadas e rápidas, nos deixam felizes quando a gente vê no setlist.
W: Espero que a gente consiga ver aqui no Brasil, ainda não ouvimos.
S: Seria demais! Eu os vi tocando “Out in LA”, quando tocaram no show beneficente para o Conservatório de Música do Flea. Eu falei para ele: “Deixei essa no esquema para o caso de vocês quererem tocar”. Quem sabe se eles vão tocar?
W: Você tem uma música favorita? No palco, enquanto eles estão tocando?
S: No momento? Deixa eu ver…É engraçado, mas…Qualquer música rápida, como “Right On Time”.
W: Você consegue usar todos os tipos de luzes em músicas como essas, né?
S: Sim, eu gosto de músicas rápidas. Coisas dinâmicas. Eu sei que baladas são legais e as pessoas gostam. Mas para quem trabalha com luzes, é meio que o momento que você para para tomar um café.
W: Tem algum show que você lembra que deu algum problema do tipo que ficou “Meu Deus, as luzes não estão funcionando”? Se lembra de algo do tipo?
S: Eles têm momentos que não gostam de mim. Teve um momento da minha vida, há alguns meses, em que o John e o Anthony estavam incomodados com as luzes e não queriam que algumas ficassem acesas. Eu fiquei sem saber o que fazer. Parte do meu trabalho é deixá-los confortáveis e a outra parte é fazer com que as pessoas consigam enxergá-los. É por isso que eles estão aqui. Então diminuíram as reclamações por um tempo, mas estou retomando para deixar em um bom nível fotográfico. Espero que eles esqueçam e que não estejam me ouvindo agora. Eles estão lidando bem com isso. Especialmente com um público como esse (brasileiro), eles toleram muito mais o fato de eu jogar mais luzes neles. Nós tentamos evitar, não tem luzes vindo de frente, nem nada. As luzes vêm de lado. Então eles ficam com uma boa visão periférica e não ficam sem enxergar, não tem muitas luzes no rosto deles. Não sei do que eles possam reclamar.
W: E ao longo desses 24 anos com eles, você tem algum show favorito? Algum show que achou gigantesco?
S: Pensando agora, rapidamente, o show em Giza com as pirâmides. Aquilo foi demais! Fiquei surpreso que conseguimos fazer aquilo. Foi insano conseguir fazer aquilo. Trabalhamos junto com o ministro das Antiguidades para colocar as coisas que tivemos que usar, como luzes antigas, aeroportos antigos, para conseguir iluminar as pirâmides. Ter coisas que não são perfeitas às vezes são as coisas mais legais, sabe? E eu fiz uma pirâmide que continua lá, outras bandas estão usando. Não fiz sozinho, todos nós fizemos. O produtor Narci Martinez, eu e alguns egípcios incríveis fizemos uma pirâmide e mostramos para o Flea e para os caras o que estávamos fazendo. Ele falou: “Uma pirâmide? Não sei. Tem algum outro formato que possa ficar melhor?”. Eu fiquei meio sem entender, talvez fazer um quadrado? Então ele falou: “Até achar algo melhor, segue dessa forma”. E eu segui.
W: E falando sobre outras bandas que você já trabalhou, como Jane’s Addiction, Offspring, Alice in Chains: como é trabalhar com outras bandas? Cada banda tem um critério para trabalhar as luzes? Como funciona?
S: Muitas das bandas não exigem algo logo de cara. O vocalista do Offspring é um cara muito inteligente, ele se envolve. Perry Farrell com certeza se envolve também. Ele é um artista. Isso já faz muitos anos, mas ele estava junto tendo muitas ideias e fizemos muitas coisas juntos, foi divertido. Mas muitas bandas apenas tocam as músicas. O Bryan Adamsé muito envolvido com o show porque ele também é fotógrafo. Então ele realmente se envolve com os vídeos. Vamos dizer que uns 20% das bandas participam do que estamos criando.
W: E falando sobre músicas que você gosta de ouvir: sei que você é fã de Iron Maiden. O que mais você gosta de ouvir quando está em casa?
S: No momento, apenas Blues antigos de pessoas que já morreram, como Skip James, muitas músicas no estilo Delta Blues. No momento é isso, não sei por que estou com esse tipo de humor. Tom Waits e músicos negros que já faleceram, sabe?
W: Quero falar com você sobre o Sepultura. Você estava conversando com a gente sobre o Sepultura antes da entrevista começar contando que já fez as luzes para alguns shows deles. Como foi essa experiência?
S: Foi demais! Só posso dizer coisas legais sobre esses caras. Eles são muito família, se preocupam com a equipe, as pessoas em geral. São pessoas legais e bonitas, sabe? Não se assuste com eles.
W: Scott, muito obrigado por nos receber aqui no palco! Foi muito legal conversar com você. Muito obrigado mesmo. E queremos mostrar o seu trabalho amanhã durante o show.
S: Claro, por que não? Excelente, obrigado!Valeu pelo papo, foi divertido.
Confira algumas fotos feitas pelo Anderson Carvalho: